sexta-feira, 24 de abril de 2015

I Diretriz de Ressuscitação Cardiopulmonar e Cuidados Cardiovasculares de Emergência da Sociedade Brasileira de Cardiologia: Resumo Executivo

Gonzalez, Maria Margarita el al., 2013. 

Resumo 
Apesar de avanços nos últimos anos relacionados à prevenção e a tratamento, muitas são as vidas perdidas anualmente no Brasil relacionado à parada cardíaca e a eventos cardiovasculares em geral. O Suporte Básico de Vida envolve o atendimento às emergências cardiovasculares principalmente em ambiente pré-hospitalar, enfatizando reconhecimento e realização precoces das manobras de ressuscitação cardiopulmonar com foco na realização de compressões torácicas de boa qualidade, assim como na rápida desfibrilação, por meio da implementação dos programas de acesso público à desfibrilação. Esses aspectos são de fundamental importância e podem fazer diferença no desfecho dos casos como sobrevida hospitalar sem sequelas neurológicas. O início precoce do Suporte Avançado de Vida em Cardiologia também possui papel essencial, mantendo, durante todo o atendimento, a qualidade das compressões torácicas, adequado manejo da via aérea, tratamento específico dos diferentes ritmos de parada, desfibrilação, avaliação e tratamento das possíveis causas. Mais recentemente dá-se ênfase a cuidados pós-ressuscitação, visando reduzir a mortalidade por meio do reconhecimento precoce e tratamento da síndrome pós-parada cardíaca. A hipotermia terapêutica tem demonstrado melhora significativa da lesão neurológica e deve ser realizada em indivíduos comatosos pós-parada cardíaca. Para os médicos que trabalham na emergência ou unidade de terapia intensiva é de grande importância o aperfeiçoamento no tratamento desses pacientes por meio de treinamentos específicos, possibilitando maiores chances de sucesso e maior sobrevida.

Introdução 

Embasada no consenso científico internacional de 2010 e atualizada com algumas novas evidências científicas recolhidas nesses dois últimos anos, ocorre a edição da I Diretriz de Ressuscitação Cardiopulmonar e Cuidados Cardiovasculares da Sociedade Brasileira de Cardiologia que visa atender às realidades brasileiras. Aspectos epidemiológicos Apesar de avanços nos últimos anos relacionados à prevenção e a tratamento, muitas são as vidas perdidas anualmente no Brasil relacionadas à parada cardiorrespiratória (PCR), ainda que não tenhamos a exata dimensão do problema pela falta de estatísticas robustas a esse respeito. Os avanços também se estendem à legislação sobre acesso público à desfibrilação e obrigatoriedade de disponibilização de desfibrilador externo automático (DEA), bem como no treinamento em ressuscitação cardiopulmonar (RCP), missão em que a Sociedade Brasileira de Cardiologia apresenta, há muitos anos, uma posição de destaque. Podemos estimar algo em torno de 200.000 PCRs ao ano no Brasil, sendo metade dos casos em ambiente hospitalar, e a outra metade em ambiente extra-hospitalar.

Suporte básico de vida no adulto para profissionais de saúde

A realização imediata de RCP em uma vítima de PCR, ainda que apenas com compressões torácicas no pré-hospitalar, contribui sensivelmente para o aumento das taxas de sobrevivência1-6. Portanto, as ações realizadas durante os minutos iniciais de atendimento a uma emergência são críticas em relação à sobrevivência da vítima, o que inclui o Suporte Básico de Vida (SBV). Em uma situação de PCR, um mnemônico pode ser utilizado para descrever os passos simplificados do atendimento em SBV: o “CABD primário” 7,8. Checar responsividade e respiração da vítima, chamar por ajuda, checar o pulso da vítima, compressões torácicas (30 compressões), abertura das vias aéreas, boa ventilação (2 ventilações após 30 compressões torácicas), desfibrilação

Deve-se, antes de qualquer atendimento em ambiente extra-hospitalar, verificar a segurança do local. Com o local seguro, ao abordar a vítima, toque-a pelos ombros. Observe se há movimento torácico de respiração em menos de 10 segundos e se estiver ausente ou se a vítima estiver apenas com gasping, chame ajuda imediatamente ligando para o número local de emergência. Verifique o pulso da vítima em menos de 10 segundos e, caso haja pulso, aplique uma ventilação a cada 5 a 6 segundos e cheque o pulso a cada 2 minutos; se não detectar pulso na vítima ou estiver em dúvida, inicie os ciclos de compressões e ventilações. Inicie ciclos de 30 compressões e 2 ventilações, considerando que existe um dispositivo de barreira (por exemplo, máscara de bolso para aplicar as ventilações). Para realização das compressões torácicas: posicione-se ao lado da vítima – que deve ter o tórax desnudo, coloque a região hipotênar da mão sobre o esterno da vítima e a outra mão sobre a primeira, entrelaçando-a, estenda os braços e se posicione cerca de 90° acima da vítima, comprima na frequência de, no mínimo, 100 compressões/minuto, com profundidade de, no mínimo, 5 cm e permita o retorno completo do tórax após cada compressão, sem retirar o contato das mãos com o mesmo. Minimize interrupções das compressões e reveze com outro socorrista a cada dois minutos para evitar a fadiga e compressões de má qualidade. Para não retardar o início das compressões torácicas, a abertura das vias aéreas deve ser realizada somente depois de aplicar trinta compressões. As ventilações devem ser realizadas em uma proporção de 30 compressões para 2 ventilações com apenas um segundo cada, fornecendo a quantidade de ar suficiente para promover a elevação do tórax. Independentemente da técnica utilizada para aplicar ventilações, será necessária a abertura de via aérea, que poderá ser realizada com a manobra da inclinação da cabeça e elevação do queixo e, se houver suspeita de trauma, a manobra de elevação do ângulo da mandíbula. A ventilação com a bolsa-válvula-máscara deve ser utilizada na presença de dois socorristas, um responsável pelas compressões e outro por aplicar as ventilações com o dispositivo. Em vítima que não respira ou respira de forma anormal (somente gasping), porém apresente pulso, se encontra, portanto, em PCR. Nesses casos, realize uma ventilação a cada 5 a 6 segundos para vítimas adultas. Para crianças e lactentes, aplique uma ventilação a cada 3 a 5 segundos. A desfibrilação precoce é o tratamento específico para PCR em FV/Taquicardia Ventricular sem pulso, pode ser realizada com um equipamento manual (somente manuseado pelo médico) ou com o DEA, que poderá ser utilizado por qualquer pessoa assim que possível. Esse aparelho pode ser manuseado por leigos, e os passos para seu manuseio se resume em ligá-lo e seguir as instruções que serão dadas por ele. 

Suporte avançado de vida em cardiologia no adulto 

Dos adultos vítimas de parada cardíaca em ambiente intrahospitalar, grande parte apresenta ritmo de Atividade elétrica sem pulso (37%) e Assistolia (39%) como ritmo inicial de PCR9 . Os ritmos de Fibrilação Ventricular e Taquicardia Ventricular sem pulso (FV/TVSP) são responsáveis por 23% a 24% dos eventos de PCR em ambiente intra-hospitalar, apresentando as maiores taxas de sobrevida, 36 a 37%. A sobrevida geral, considerando todos os ritmos de PCR, é de 18% 9,10.

Manejo da via aérea 

A escolha do melhor método de ventilação deve ser feita com base na experiência do socorrista, sendo aceitável a utilização do dispositivo de bolsa-válvulamáscara, isoladamente ou em combinação com a cânula orotraqueal, assim como a máscara laríngea, o combitube ou o tubo laríngeo. O uso de oxigênio a 100% é razoável durante as manobras de RCP com o objetivo de aumentar a oxi-hemoglobina arterial e a oferta de oxigênio. Embora a exposição prolongada a 100% seja tóxica, não existem evidências que ocorra toxicidade com a exposição breve, como no cenário da RCP em adultos. A ventilação com dispositivo bolsa-válvula-máscara é um método aceitável para a ventilação durante as manobras de RCP, mas requer treinamento contínuo para seu uso adequado. Idealmente, esse dispositivo deve ser utilizado por 2 socorristas. Durante a RCP, devem ser realizadas 2 ventilações após 30 compressões torácicas. No caso de PCR intra-hospitalar por FV/TV refratária e, principalmente, por AESP /assistolia, a ventilação com cânula orotraqueal é o método mais recomendado no manejo da via aérea. A interrupção da realização das compressões torácicas por motivo da intubação orotraqueal deverá ser minimizada ao extremo, e a intubação deverá ser realizada somente em momento oportuno, quando não for interferir com as outras manobras de ressuscitação. O treinamento e retreinamento nessa habilidade são recomendados para socorristas que realizam esse procedimento. Não há evidências na literatura sobre o melhor momento para realizar a intubação orotraqueal durante o atendimento da PCR.

Após a colocação da cânula traqueal, é necessário checar se o seu posicionamento está correto, o que é feito inicialmente pela avaliação clínica que consiste na visualização da expansão torácica e da condensação do tubo durante a ventilação e na ausculta em 5 pontos: epigástrio, base pulmonar esquerda, base pulmonar direita, ápice pulmonar esquerdo e ápice pulmonar direito, preferencialmente nessa ordem. Além disso, o posicionamento correto do tubo deve ser confirmado com a utilização de um dispositivo. O mais indicado é a capnografia quantitativa, mas na sua ausência pode-se utilizar dispositivos detectores esofágicos e detectores de CO2 11-14. Deve-se manter a ventilação e oxigenação com intervalo de uma ventilação a cada 6 a 8 segundos, o que corresponde a 8 a 10 ventilações por minuto de maneira assíncrona às compressões torácicas, que devem ser mantidas em frequência igual ou superior a cem por minuto15,16.

Monitorização durante a PCR 

O dióxido de carbono exalado no final da expiração (expressado em mmHg – PETCO2 ) detectado pela capnografia quantitativa em pacientes intubados é correlacionado com a qualidade da RCP e com o retorno da circulação espontânea (RCE). Durante a PCR não tratada, a produção de CO2 é mantida, porém não existe liberação pelos pulmões, sendo a presença de débito cardíaco a maior determinante da liberação do PETCO2 . Os valores do PETCO2 são correlacionados com o RCE e com a pressão de perfusão coronária. Valores < 10 mmHg revelam pouca probabilidade de RCE, indicando a necessidade de melhora na qualidade da RCP17-20. Outro mecanismo muito útil para a monitorização da RCP é a medida da pressão arterial diastólica (PAD) naqueles pacientes que dispõem de monitorização arterial invasiva no momento da PCR. Seu valor é correlacionado com a pressão de perfusão coronária e com o RCE. Nas situações em que a pressão de relaxamento (diastólica) é < 20 mmHg, é razoável considerar melhorar a qualidade da RCP, melhorando as compressões torácicas e as drogas vasoativas. Vale ressaltar que a presença de dispositivos arteriais também pode reduzir o tempo de interrupção da RCP na checagem de pulso em pacientes com atividade elétrica organizada. Saturação venosa central < 30% é relacionada à impossibilidade de atingir o RCE; sugerindo-se então que, durante a PCR, é necessário manter valores acima de 30%.

Manejo da parada cardíaca 

A parada cardíaca pode ser causada por quatro ritmos: Fibrilação Ventricular (FV), Taquicardia Ventricular Sem Pulso (TVSP), Atividade Elétrica Sem Pulso (AESP) e Assistolia. A sobrevida dos pacientes depende da integração do SBV, do suporte avançado de vida em cardiologia (SAVC) e dos cuidados pós-ressuscitação. 

As pausas durante as manobras de RCP devem ser minimizadas e restritas a checagem de ritmo, desfibrilação, checagem de pulso quando houver ritmo organizado e breve pausa para obtenção e confirmação de uma via aérea avançada21,22. A monitorização da qualidade da RCP é fortemente recomendada. O atraso no início da administração de vasopressores para além dos primeiros cinco minutos de PCR, bem como a demora em instalar via aérea avançada podem estar associados a pior prognóstico. Assim, pode-se sugerir o início do uso de vasopressores nos primeiros ciclos de RCP23-25. Durante a tentativa de ressuscitação, o socorrista deve tentar identificar a causa da PCR – diagnóstico diferencial. A maioria das causas de parada pode ser resumida na memorização mnemônica “5 Hs e 5 Ts”, a saber: Hipóxia, Hipovolemia, Hidrogênio (acidose), Hiper/Hipocalemia, Hipotermia; Tóxicos, Tamponamento cardíaco, Tensão no tórax (pneumotórax hipertensivo), Trombose coronária (infarto agudo do miocárdio), Tromboembolismo pulmonar26-28. Para o ideal atendimento da PCR, além de ênfase na RCP de boa qualidade, deve-se atentar ao papel de cada um na equipe de ressuscitação. O treinamento do atendimento de PCR em equipe minimiza erros e é recomendado29. Os dois princípios fundamentais do bom trabalho em equipe são: liderança e comunicação efetiva30,31. Assim, a cada atendimento, deve haver um profissional que assuma o papel de líder na condução do caso. Esse profissional deve garantir que todas as tarefas sejam compreendidas e executadas pelos diferentes membros da equipe, incorporar novas informações, reavaliar o caso, centralizar a comunicação entre os membros da equipe e avaliar o desempenho de seus colegas, garantindo RCP de boa qualidade, controle adequado da via aérea e segurança na manipulação do desfibrilador.

Tratamento da fibrilação ventricular e taquicardia ventricular sem pulso 

Quando a monitorização com desfibrilador manual revela ritmo de FV/TVSP, a prioridade deve ser a desfibrilação o mais precoce possível, assim que disponível, uma vez que duração da arritmia é fator prognóstico para o sucesso da desfibrilação, sendo máximo se a desfibrilação é realizada com desfibrilador manual ou automático em até 3 minutos do início da FV. Durante a reanimação, devem se consideradas drogas vasopressoras e antiarrítmicas, bem como identificar e tratar causas potencialmente reversíveis26-28. Se um desfibrilador bifásico estiver disponível, a energia do choque deve ser entre 120-200J conforme as orientações do fabricante. Se o socorrista desconhece as orientações do fabricante o choque deve ser administrado com a energia máxima disponível no aparelho. Se um desfibrilador monofásico estiver disponível, o choque deve ser administrado com 360J assim como os choques subsequentes26. Após o primeiro choque, preferencialmente com desfibrilador bifásico, procede-se RCP por 2 minutos, seguida de checagem de ritmo no monitor. Caso FV/TV persista, procede-se a um novo choque de alta energia, seguido por RCP durante 2 minutos. O melhor momento para administrar o vasopressor não é estabelecido, devendose considerar seu início após o estabelecimento do acesso venoso. A administração precoce poderia otimizar o fluxo sanguíneo miocárdico antes do próximo choque. Há evidências sugerindo que o início precoce das drogas melhore o prognóstico21,24,25. Em qualquer ritmo de PCR, a primeira droga a ser utilizada deve ser um vasopressor. Embora o nível de evidência seja limitado, recomenda-se administração de adrenalina 1 mg a cada três a cinco minutos32. A primeira ou segunda dose de adrenalina pode ser substituída por vasopressina 40 U. Caso haja persistência de FV ou TVSP, apesar da RCP, desfibrilação e vasopressor, indica-se um antiarrítmico: amiodarona (antiarrítmico de escolha) ou lidocaína. A amiodarona, um antiarrítmico classe III de Vaughan-Williams, é a droga antiarrítmica de primeira escolha no tratamento da FV/TVSP refratária após a droga vasopressora e nova desfibrilação. 

Tratamento da assistolia e da atividade elétrica sem pulso (AESP) 

São ritmos em que a desfibrilação não está indicada. Devese, então, promover RCP de boa qualidade, aplicar as drogas indicadas e procurar identificar e tratar as causas reversíveis27. Se no momento da checagem de ritmo, após dois minutos contínuos de RCP, houver um ritmo organizado no monitor, procede-se à checagem do pulso central carotídeo por cinco a 10 segundos. Caso não haja pulso palpável nesse período, identifica-se AESP. Para ritmo de Assistolia ou AESP, um vasopressor, adrenalina ou vasopressina pode ser administrado com o objetivo de incrementar o fluxo sanguíneo cerebral e miocárdico33. O uso rotineiro de atropina não é recomendado. 

O uso da vasopressina no lugar da primeira ou segunda dose de adrenalina pode ser realizado, mas metanálise não demonstrou diferenças entre as duas para nenhum dos ritmos de PCR. Não há evidência clara de benefício terapêutico com uso rotineiro de atropina no tratamento da PCR em AESP. AESP e Assistolia podem ser causadas por condições reversíveis e tratadas com sucesso se forem detectadas. Durante os 2 minutos de RCP, os socorristas devem lembrar dos “5Hs e 5Ts”. Na AESP, quando existe a suspeita de um tromboembolismo pulmonar, a administração empírica de trombolíticos deve ser considerada. As recomendações para o manejo da PCR em assistolia e AESP são ilustradas na Tabela 4. A Figura 2 ilustra o Algoritmo do tratamento da parada cardíaca em Atividade elétrica sem pulso ou Assistolia.

Vias para administração de medicamento Durante a parada cardíaca a prioridade sempre será administrar RCP de boa qualidade e desfibrilação imediata; a administração de drogas será secundária. Depois da tentativa de desfibrilação, os socorristas devem estabelecer um acesso intravenoso (IV) ou intraósseo (IO), sem interrupção das compressões torácicas. Deve-se escolher, de preferência, o acesso venoso periférico nos membros superiores (veia antecubital). Se não for possível estabelecer acesso IV, a via intraóssea (IO), para administração de drogas, pode proporcionar concentrações plasmáticas adequadas, similares às alcançadas pelo acesso intravenoso. A administração de medicamentos por um acesso central pode ser considerada se não houver nenhuma contraindicação. Estudos têm demonstrado que drogas como lidocaína, adrenalina, atropina, naloxone e vasopressina podem ser absorvidas por via endotraqueal. Porém, a administração intravenosa (IV) ou intraóssea (IO) de medicamentos é preferível à administração endotraqueal.   

Cuidados pós-ressuscitação cardiopulmonar 

Cuidados organizados pós-PCR com ênfase em programas multidisciplinares têm como finalidade diminuir, numa fase inicial, a mortalidade associada à instabilidade hemodinâmica e, como consequência, limitar o dano cerebral e a lesão nos demais órgãos. O tratamento deve estar direcionado para disponibilizar um suporte que inclua ressuscitação volêmica, uso de drogas vasoativas, ventilação mecânica e o emprego de dispositivos de assistência circulatória.

O termo síndrome pós-PCR se refere a um processo fisiopatológico complexo de lesão tecidual secundária à isquemia, com injúria adicional de reperfusão34. Nessa síndrome, estão presentes e são reconhecidos quatro componentes principais: injúria cerebral, disfunção miocárdica, isquemia de reperfusão e intervenção na patologia precipitante35. Após o RCE, obtenção de uma via aérea definitiva adequada para suporte da ventilação mecânica se faz necessária. É nesse momento, por exemplo, que uma máscara laríngea colocada em regime de emergência deve ser trocada por uma cânula orotraqueal. A oxigenação do paciente deve ser monitorizada de forma contínua com oximetria de pulso. O capnógrafo, quando disponível, pode auxiliar no estabelecimento da via aérea definitiva em local apropriado. Na ausência de contraindicações, a cabeceira do leito deve ser mantida elevada ao menos a 30˚ para prevenir edema cerebral, broncoaspiração e pneumonia associada à ventilação mecânica. A respeito da oferta ideal de oxigênio, a recomendação é que, já na primeira hora, a fração inspirada de oxigênio (FIO2) seja ajustada para uma saturação arterial entre 94% e 96%, evitando assim a hiperoxia – que facilita aumento no estresse oxidativo e está associada a pior prognóstico neurológico36. 

Cuidados com volume corrente devem ser instituídos a fim de evitar barotrauma, volutrama e biotrauma. Eletrocardiograma de 12 derivações deverá ser precocemente realizado após o RCE para que possam ser detectadas elevações do segmento ST ou bloqueio de ramo esquerdo supostamente novo. Mesmo na ausência de elevação do segmento ST, mas na suspeita de Síndrome Coronariana Aguda, tratamentos medicamentosos ou intervencionistas devem ser iniciados e não devem ser atrasados devido ao estado de coma. A realização simultânea de intervenção coronária percutânea e hipotermia é segura e apresenta bons resultados. O emprego de drogas vasoativas está indicado para adequar o débito cardíaco, e deve ser administradas preferencialmente por meio de acesso venoso central. Pelo fato de Hipotermia Terapêutia (HT) ser a única intervenção que demonstrou melhora da recuperação neurológica, deve ser considerada para qualquer paciente que seja incapaz de obedecer comandos verbais após o RCE37-40. Evidências indicam que pacientes adultos comatosos, ou seja, que não apresentam resposta adequada aos comandos verbais, e que apresentem RCE após PCR no ritmo de FV / TVSP fora do ambiente hospitalar, devem ser resfriados a 32° a 34° C por 12 a 24 horas.

Apesar de não haver estudos consistentes específicos de hipotermia em subgrupos de pacientes que apresentam PCR em ritmo não chocável, a hipotermia induzida também pode beneficiar pacientes adultos em coma, com RCE após PCR fora do hospital a partir de outros ritmos, como assistolia ou atividade elétrica sem pulso, ou nas paradas cardíacas intra-hospitalares. A temperatura central do paciente deve ser monitorada continuamente por meio de termômetro esofágico, cateter vesical ou cateter de artéria pulmonar. O resfriamento deve ser iniciado prontamente, preferencialmente no local do evento ou até 6 horas após o RCE. A fase de manutenção se inicia ao atingir temperatura de 34° C, e se extende por 24 horas. Os cuidados são direcionados para controle rigoroso de temperatura, a fim de se evitar o híper resfriamento (temperatura < 32° C). O início da fase do reaquecimento não implica na descontinuidade imediata dos dispositivos de resfriamento, já que o ganho de temperatura deverá ser gradativo. A velocidade ideal do reaquecimento não é conhecida; o consenso é para que o ganho seja de 0,25 a 0,5° C a cada hora. A observação por tempo superior a 72 horas é recomendada naqueles submetidos à HT antes da avaliação do prognóstico. Devem ser consideradas estratégias para tratar a hiperglicemia, já que valores de glicemia > 180 mg/dl em pacientes com RCE podem ser deletérios. A hipoglicemia deve ser evitada. Dessa forma, estratégias para um controle glicêmico moderado – glicemias entre 144 e 180 mg/dl – podem ser instituídas para adultos com RCE.

A complexidade dos cuidados pós-RCP é sabidamente comprovada. O avanço tecnológico e a intervenção precoce trouxeram maior perspectiva de sobrevida, contudo os desafios ainda são grandes. Neste contexto, a hipotermia é um dos tópicos que certamente ainda deverá ocupar um maior espaço na terapêutica a ser oferecida. 

Fonte: http://disciplinas.stoa.usp.br/pluginfile.php/169209/mod_resource/content/2/Diretriz%20Brasileira%20para%20RCP%20-%20I%20Diretriz%20de%20Ressuscita%C3%A7%C3%A3o%20Cardiopulmonar%20e%20Cuidados%20Cardiovasculares%20de%20Emerg%C3%AAncia%20da%20Sociedade%20Brasileira%20de%20Cardiologia%20Resumo%20Executivo.pdf 

sábado, 11 de abril de 2015

VERIFICAÇÃO DO VOLUME RESIDUAL GÁSTRICO EM UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA

Satomi Mori* Cláudia Satiko Takemura Matsuba** Iveth Yamaguchi Whitaker***

* Enfermeira da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital São Paulo - UNIFESP. ** Aluna do Mestrado de Saúde do Adulto da UNIFESP. Enfermeira da UTI do Hospital do Coração – São Paulo. *** Enfermeira. Docente do Departamento de Enfermagem da UNIFESP. E-mail do autor: morisat@yahoo.com

Resumo

Este estudo descritivo teve como objetivos verificar se o volume residual gástrico (VRG) é avaliado antes de administrar a dieta e as condutas da equipe de enfermagem diante desse fator. A maioria (76,56%) dos membros da equipe de enfermagem não verificou o VRG antes de infundir a dieta por sonda nasogástrica (SNG), embora 90,63% tenha informado que realiza o procedimento. Do total, 20,31% afirmaram abrir a SNG a partir de 100ml de VRG, a maioria referiu desprezar o aspirado e 57,81% citaram administrar 100% do volume prescrito independente do VRG aspirado pela SNG. O estudo revelou a necessidade de supervisão e orientação para a equipe de enfermagem relacionada aos cuidados pertinentes à infusão da dieta por SNG. Descritores: enfermagem; volume residual; dieta; sonda.
1 Introdução: 
A avaliação do estado nutricional de quatro mil doentes internados em hospitais da rede pública do Brasil, realizada pela Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral(1) em 1996, mostrou que 48,12% foram classificados como desnutridos. O estudo salientou ainda que à medida que o período de internação prolonga-se, aumentam os riscos para a desnutrição. Os pacientes graves internados em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) merecem uma atenção especial em relação ao estado nutricional. Tal precaução deve-se ao fato de estarem totalmente dependentes para se alimentarem, por apresentarem maior consumo das reservas energéticas e nutricionais em razão da própria condição clínica e resposta a tratamento mais agressivo. Vários fatores interferem na manutenção de uma nutrição adequada e podem estar relacionados ao paciente, à doença, ao tratamento e à terapia nutricional. Aqueles que se referem ao paciente e à doença, mencionam a presença de náuseas, vômitos, íleo paralítico, diarréia e mudança de hábitos alimentares. A necessidade de longos períodos de jejum e maior consumo calórico-protéico para realização de procedimentos são considerados fatores relacionados ao tratamento. Quanto aos fatores sobre a terapia nutricional, encontram-se os que prejudicam a sua continuidade como, por exemplo, a falha na comunicação entre os profissionais que prestam assistência ao paciente grave(1,2). Quando o paciente não consegue alimentar-se, adequadamente, por via oral, outras vias alternativas podem ser utilizadas, se o trato digestivo estiver íntegro poderá ser utilizada a via gástrica ou enteral para administrar a dieta por sonda. Na terapia nutricional gástrica ou enteral, a atuação da enfermeira é fundamental e envolve vários aspectos do cuidado. Além do controle da infusão das dietas e dos complementos, a enfermeira é responsável pelo estabelecimento de acesso gástrico ou enteral, pela via oral ou nasal (1,3,4), incluindo, a avaliação, o seguimento diário da evolução do estado nutricional dos pacientes. O funcionamento e a manutenção dos equipamentos usados na terapia nutricional também devem ser verificados pela enfermeira (5). A observação do volume residual gástrico (VRG), antes de infundir a dieta, é uma medida importante que possibilita conferir a posição da sonda, o volume e características como: coloração, odor e textura que são fundamentais para a tomada de decisão sobre a infusão da dieta. Volume residual alto tem sido considerado um marcador de intolerância gástrica à terapia nutricional. Assim, um dos fatores que interferem na oferta energética é a existência de débito elevado do VRG(6). Na prática diária em cuidados intensivos, percebe-se que a tomada de decisão para a infusão da dieta, mediante a avaliação do VRG aspirado pela SNG, varia de uma equipe de enfermagem para outra. As condutas modificam-se desde a interrupção temporária da infusão da dieta, manutenção da SNG aberta ou fechada, até a infusão da mesma em diferentes quantidades obtidas de VRG, o que indica, aparentemente, a inexistência de um critério claramente estabelecido. A falha na determinação desses critérios pode levar ao aproveitamento inadequado da dieta, dos eletrólitos presentes na estase gástrica, colaborando para o aumento dos índices de desnutrição hospitalar pelo fato dos pacientes graves apresentarem-se em condições de intenso catabolismo. Diante dessa prática e considerando os motivos, que podem favorecer o surgimento de distúrbios gastrointestinais, realizou-se este estudo, com a finalidade de analisar as condutas da equipe de enfermagem relacionadas à verificação do VRG em pacientes internados na UTI e oferecer subsídios para uma prática segura quanto à infusão da dieta pela SNG.
2 Objetivos:
Verificar se o VRG é avaliado pela equipe de enfermagem da UTI, antes de administrar a dieta por SNG. - Verificar a conduta da equipe de enfermagem da UTI para infundir a dieta por SNG na presença do VRG. 
3 Material e método:
Este estudo descritivo sobre VRG e a conduta da equipe de enfermagem antes de infundir a dieta por SNG foi realizado na UTI geral de um Hospital Universitário de porte extra-grande, localizado no Município de São Paulo. No período da coleta de dados, a UTI possuía 14 leitos ativos. A população constituiu-se de enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem que prestavam assistência direta aos pacientes. Entre os 16 enfermeiros foram incluídos 14, visto que dois exerciam função, essencialmente, gerencial, sem o caráter de assistência direta ao paciente. Todos os técnicos (7) e auxiliares de enfermagem (43) foram incluídos. A coleta de dados foi realizada, após a obtenção da autorização da Chefia de Enfermagem e Médica da UTI e da aprovação do Comitê de Ética da Instituição. O Termo de Consentimento Livre e esclarecido foi obtido de todos os que participaram do estudo. O procedimento de coleta de dados envolveu duas etapas, descritas a seguir:
Etapa I: Nesta fase, a rotina diária da equipe de enfermagem para administração da dieta em pacientes que possuíam SNG, foi observada com base em roteiro estruturado. As observações foram realizadas em todos os períodos de trabalho das equipes, de 14 de outubro a 24 de novembro de 2001. A observação abrangeu desde o momento em que cada enfermeiro, técnico e auxiliar de enfermagem obteve o frasco da dieta, proveniente do serviço de nutrição e dietética, para administrar ao paciente até o término da infusão ou do tempo de infusão da dieta (1h30min). Cada membro da equipe de enfermagem foi observado uma única vez. 
Etapa II: De 28 de novembro a 09 de dezembro de 2001, após o período de observação da rotina, foi aplicado um formulário à população do estudo com questões relacionadas aos itens da observação. As questões relacionaram-se à ação primária do profissional que presta assistência ao paciente com SNG, antes da infusão da dieta (se o VRG é verificado ou não) e diante da presença do VRG (manutenção da SNG aberta, interrupção da dieta e destino do VRG). Os dados foram analisados baseados em estatística descritiva. 4 Resultados 4.1 Observação da prática diária para infusão da dieta por SNG: No período de observação da rotina diária da equipe de enfermagem para administração da dieta por SNG, notou-se que do total de 14 enfermeiros somente 1 (7,14%) realizou o procedimento. No grupo de técnicos e auxiliares de enfermagem (téc./aux.), a observação abrangeu 48 (96%) do total de 50 funcionários. A etapa de observação revelou que 76,56 % da população do estudo não verificaram o VRG, antes da administração da dieta por SNG. Esta prática foi constatada em todos os períodos de trabalho da equipe de enfermagem. Diante do resultado obtido na primeira etapa do estudo, os demais itens não puderam ser observados. Os aspectos que seriam observados relacionava-se ao volume do conteúdo residual gástrico, à conduta de enfermagem diante do VRG ( SNG aberta ou fechada) e ao destino do VRG (re-introdução ao paciente ou eliminada). Em relação ao volume de dieta presente em cada frasco e o volume infundido, verificou-se que, do total de 49 observações, em 19 (38,8%) a dieta não foi totalmente infundida. O volume de dieta a ser infundido variava de 50 a 250 ml. Do total de 49 funcionários observados, 61,2% administraram o volume total prescrito; 30,6% infundiram um volume menor que o prescrito e em 8,2% dos casos a dieta prescrita não foi administrada 4.2 Conduta da equipe de enfermagem para infundir a dieta por SNG Na segunda etapa do estudo, 14 enfermeiros (100%) e 48 téc./aux. (96%) responderam às questões do formulário sobre a conduta da equipe de enfermagem para infundir a dieta por SNG. Do total de membros da equipe de enfermagem, 90,63% afirmaram verificar o VRG antes de infundir a dieta por SNG. A totalidade dos enfermeiros e 88% dos téc. e aux. de enfermagem afirmaram aspirar a SNG, antes de infundirem a dieta. Em relação à freqüência da verificação do VRG antes de infundir a dieta, constatou-se que 33 (51,56%) dos membros da equipe de enfermagem responderam que sempre realizavam a verificação; quatro (6,25%) entre téc./aux. responderam que nunca verificavam o VRG, antes de infundirem a dieta. A razão mais citada, para aspirarem a SNG antes de infundirem a dieta, foi a necessidade de avaliar o VRG (41), seguida da verificação da localização da sonda (25). Outras razões menos citadas incluíam a verificação da perviedade da SNG (3), a profilaxia da broncoaspiração (2) e a avaliação da distensão gástrica (1). Constatou-se uma variedade de respostas quanto à quantidade do VRG, à partir da qual a SNG seria mantida aberta, antes de infundir a dieta. O volume total considerado para a tomada de decisão, variou de 2 a 300 ml. Entre os enfermeiros, 4 (28,58%) responderam abrir a SNG quando o VRG aspirado for superior a 50% do volume da dieta a ser infundida. No grupo de téc./aux., verificou-se que o porcentual mais elevado (20%) correspondeu a 100 ml do VRG aspirado. As respostas sobre o tempo em que a SNG é mantida aberta, na vigência de VRG foram variadas. Na população estudada, 21 (32,82%) disseram aguardar três horas para infusão da próxima dieta, seguida de 13 (20,32%) que relataram aguardar o término do refluxo do VRG; apenas 4,69% afirmaram não abrir a SNG. Embora não tenha sido possível observar, na primeira fase do estudo, o destino que a equipe de enfermagem dava ao VRG aspirado pela SNG antes de infundir a dieta, na segunda etapa, as necessidades apontaram uma prática freqüente. Do total, 50 (78,13%) responderam desprezar o conteúdo aspirado e 8 (12,5%) afirmaram devolver o conteúdo aspirado pela SNG ao paciente. Quando questionados a respeito do volume da dieta, que infundem no paciente, após a verificação do VRG, 37 (57,81%) citaram administrar 100% do volume prescrito pelo médico e 10 (15,62%) responderam infundir 50% do volume prescrito. Só no grupo de téc./aux., verificou-se uma resposta que afirmava descontar o VRG aspirado do volume de dieta prescrito. 
5 Discussão:
O emprego precoce da terapia nutricional apresenta benefícios consideráveis na recuperação do paciente grave. Assim, entre os objetivos terapêuticos de primeira ordem em pacientes críticos encontra-se a nutrição. Ainda que fracionada e em pequenos volumes, a infusão da dieta pode prevenir a atrofia da mucosa gástrica(7) e diminuir a translocação bacteriana(8). A enfermeira desempenha um importante papel na prevenção das complicações sérias relacionadas à administração da dieta por sondas. “A equipe de enfermagem deve conhecer a importância do suporte nutricional e deve ser capaz de reconhecer complicações potenciais e intervir, imediatamente, quando estas acontecem(5:485)”. As complicações mais comuns são a diarréia, náusea e a broncoaspiração. A diarréia é um indicativo de sobrecarga osmolar, sua prevenção consiste em infundir a dieta lentamente. A náusea durante a administração da dieta indica o esvaziamento gástrico lentificado, resultante do uso de sedativos nos pacientes de UTI. Nessa situação, a infusão da dieta deve ser interrompida por uma ou duas horas ou reduzir o gotejamento até aliviar o sintoma, e a enfermeira deve pesquisar a causa. Outra complicação séria e potencial é a pneumonia aspirativa. A existência de VRG elevado é risco para vômitos e aspiração. Nesse caso, a verificação do VRG antes da infusão da dieta pode evitar seu acúmulo e conseqüente broncoaspiração. A avaliação do VRG deve ser realizada aspirando-se a SNG com o auxílio de uma seringa de 20 ml(9) ou mais e é feita sempre nos momentos que antecedem a administração da dieta intermitente ou de 4/4 horas quando a dieta é contínua(10). O conteúdo gástrico aspirado deve ser avaliado quanto a seu aspecto e volume(11). A observação do VRG auxilia a equipe multiprofissional na tomada de decisão quanto à conduta no suporte nutricional. 
Na primeira etapa deste estudo, a verificação do VRG não foi realizada por 76,56% dos membros da equipe de enfermagem. Entretanto diferentemente da primeira, na segunda etapa, constatou-se que a grande maioria (90,63%) apontou sua importância e afirmou realizar o procedimento sempre (51,56%) e, às, vezes (39,07%) antes de cada infusão da dieta. Em pacientes críticos a ocorrência de refluxo gástrico elevado é freqüente e a SNG favorece o seu evento(12). Um VRG de 100 a 150 ml é considerado uma evidência de retardo no esvaziamento gástrico(5,10). Volumes acima de 140 ml podem causar o refluxo em pacientes com diminuição do tônus do esfíncter esofágico, potencializando o risco para a aspiração(13). Além dos fatores já descritos, a seleção da sonda é um aspecto importante na ocorrência de refluxo gástrico. Em pacientes internados na UTI, é possível observar o uso de SNG para drenar o conteúdo gástrico ou infundir a dieta. Por serem constituídas de material menos flexível e mais calibroso, as sondas de polietileno não são indicadas para o uso prolongado e podem provocar complicações mecânicas com maior freqüência(10). Estes podem diminuir a competência do esfíncter esofagogástrico, favorecendo o risco de refluxo, além de promover desconforto, interferir na tosse e na respiração espontânea(14). Na etapa de observação deste estudo, percebeu-se que a dieta administrada era controlada inadequadamente, resultando em infusão incompleta, correspondendo em média a 134 ml do volume médio prescrito (184 ml). A perda de parte da dieta pode estar relacionada ao controle do gotejamento da infusão, que era realizada de forma gravitacional.
Nota-se ser freqüente o paciente internado em uma UTI apresentar fatores que podem levar a desnutrição hospitalar como gasto energético, catabolismo, diarréia, vômitos, retardo na indicação da terapia nutricional entre outros(1). A falha na suplementação das necessidades calóricas e nutricionais dos pacientes só contribui para o aumento da desnutrição hospitalar. A manutenção da SNG aberta após a constatação da presença de VRG não é relatada nas referências consultadas. No entanto, essa conduta é observada com freqüência na UTI estudada, o que levou a incluí-la como um dos itens da coleta de dados. Constatou-se que um grupo significativo (37,52%) abriria a SNG com volumes muito baixos (2 a 80 ml) aspirados pela SNG, outros (20,31%) afirmaram abrir a SNG a partir de 100 ml e a manteriam aberta, em média 3 horas; houve os que conservariam a SNG aberta até o refluxo gástrico parar e poucos a abririam. Neste estudo, 78,13% dos membros da equipe de enfermagem responderam que desprezam o VRG. Além disso, 57,81% afirmaram infundir 100% da dieta prescrita, independente do VRG aspirado pela SNG. Diante das condições nutricionais do paciente crítico e associado ao fato de desprezar o VRG pode propiciar ou agravar o desequilíbrio hidroeletrolítico e as alterações do balanço nutricional(15). A velocidade de esvaziamento gástrico é controlada por vários fatores e se dá de 1 a 4 h, entre elas: o peristaltismo da musculatura do estômago; o diâmetro da luz do piloro que sofre alterações, de acordo com sinais nervosos e humorais provenientes do estômago e do duodeno; a quantidade de quimo que o intestino delgado pode processar. O desequilíbrio entre esses fatores pode ocasionar distúrbios digestivos que se manifestam pelo acúmulo de volume gástrico(16). O volume médio produzido endogenamente pela secreção da saliva e do suco gástrico é em torno de 188 ml/h(17). Em condições de intolerância gástrica, somando-se a este valor o volume da dieta que o paciente deve receber, haverá o risco para ocorrência de alguma complicação. 
O VRG é considerado como um indicador de intolerância gástrica, no entanto, não há consenso a respeito do VRG mínimo para prevenir a pneumonia aspirativa. As opiniões a respeito variam conforme o autor. Alguns consideram o VRG alto em adultos, quando o volume aspirado é em torno de 100 a 150ml(9,10); outros o consideram como sendo um conteúdo maior que 50% do volume da última dieta administrada(18). Mas, volumes acima de 200ml são considerados excessivos(19,20). Poucos estudos relatam condutas a serem tomadas na vigência de VRG elevado em pacientes com SNG e com infusão de dieta intermitente. Atualmente a maioria das condutas verificadas na literatura, referem-se à dieta enteral em infusão contínua. Casos em que o VRG atingir até 150ml, o conteúdo aspirado deve ser devolvido e a dieta infundida, quando a administração é feita de forma intermitente. Se o VRG aspirado for maior que 150ml, recomenda-se devolvê-lo e a dieta temporariamente suspensa. A infusão da dieta dependerá da reavaliação do VRG, que se estiver acima de 150ml, este deve ser desprezado e a dieta suspensa(6). As recomendações relacionadas ao VRG apresentadas na literatura, para as situações em que a dieta é administrada de forma contínua diferem daquelas verificadas para a infusão intermitente. A devolução do VRG não é consenso quando a infusão é contínua. A administração de medicação procinética é recomendada nos casos em que o VRG aspirado é acima de 150ml em duas verificações consecutivas(21). A recomendação sobre a redução do volume da dieta enteral a ser infundida na presença de VRG, também, varia entre os autores. Há aqueles que recomendam redução do volume da dieta enteral quando o VRG aspirado, pela segunda vez, é acima de 200ml(19,22) e, aqueles que a recomendam a partir da terceira vez que se aspirar um VRG elevado. A suspensão da infusão da dieta é recomendada quando o VRG é maior que 500ml ou quando o VRG aspirado for maior que 150ml pela quarta vez consecutiva. Na infusão contínua da nutrição enteral o esquema de avaliação do VRG deve ser realizada de 4/4h desde o primeiro dia de administrar da dieta até o quinto dia. A partir do sexto dia a verificação poderá ser feita em intervalos de 12/12h(21). 
Não existe um consenso no que diz respeito ao valor do VRG que determine a falência alimentar, mesmo com a presença de um VRG alto. Porém, não deve haver a interrupção imediata da alimentação, pois esta pode favorecer complicações funcionais do trato gastrointestinal e metabólicas. Tal cuidado permite ao sistema digestivo se adaptar ao aporte nutricional(20). Assim, o VRG elevado deve ser analisado juntamente com outros dados clínicos do paciente, tais como a distensão abdominal, a qualidade dos ruídos hidroaéreos e ainda do raios-X abdominal(15). Diante dos resultados do estudo torna-se evidente a importância de um controle adequado da infusão da dieta ao paciente. A equipe de enfermagem desempenha papel fundamental na promoção e manutenção dessa terapêutica, visto que é a responsável pela execução do procedimento.
6 Considerações finais:
Os resultados do estudo permitiram as seguintes conclusões: A maioria (76,56%) dos membros da equipe de enfermagem não verificou o VRG antes de infundir a dieta por SNG, embora (90,63%) tenham afirmado que realizam o procedimento. Do total de membros da equipe de enfermagem, 20,31% afirmaram abrir a SNG à partir de 100ml de VRG, 78,13% citaram desprezar o VRG aspirado, 32,82% afirmaram manter a SNG aberta por 3 horas na presença de VRG e 57,81% mencioram administrar 100% do volume prescrito para o paciente independente do VRG aspirado pela SNG. Os resultados deste estudo não permitem afirmar que a prática para a administração da dieta por SNG seja realizada com freqüência conforme o observado, pois este estudo apresenta como fatores limitantes o fato de ter sido realizada somente em uma Unidade de Terapia Intensiva e a observação de cada funcionário ter sido programada para uma única vez. Mas, este estudo permitiu verificar que, além da supervisão, há necessidade de realizar orientações freqüentes para a equipe de enfermagem sobre os cuidados que lhe são pertinentes para infusão da dieta por SNG, visto que as opiniões e a prática dos cuidados em relação a muitos aspectos do cuidado nutricional são divergentes ao que realmente é o ideal. Verificou-se que muitos sabem que o procedimento de aspirar a SNG, antes de administrar a dieta deve ser realizado, porém, ao observar as razões para a verificação do VRG só duas pessoas responderam aspirar a SNG para evitar a broncoaspiração, uma das complicações mais importantes. Desse modo, tão importante quanto as orientações é o acompanhamento diário dos procedimentos realizados pela equipe, pois só assim será possível detectar as falhas na assistência prestada e planejar ações educativas que visem a melhoria da prática assistencial.
Nota-se que embora existam inúmeros estudos referentes ao suporte nutricional e às variáveis sobre o tema, não há consenso em relação ao valor do VRG que poderia ser considerado como intolerável. Mesmo frente a estas variáveis, é necessário que exista uniformidade no processo da ação prestada pelos membros da equipe, para reduzir as possíveis falhas na assistência ao suporte nutricional adequado. Isto é possível por meio da elaboração e implantação de protocolos e de orientações sobre a prática da assistência de enfermagem no suporte nutricional.

Fonte: http://www.scielo.br/pdf/reben/v56n6/a14v56n6.pdf