sexta-feira, 1 de março de 2013

Doação de órgãos e tecidos e os dilemas éticos envolvidos



Nas últimas décadas o transplante de órgãos e tecidos tornou-se uma opção terapêutica segura e eficaz no tratamento de várias doenças, delimitando a melhoria na qualidade e na perspectiva de vida, além de proporcionar maior sobrevida aos pacientes em estado terminal (SILVEIRA, 2009; ABTO, 2009).
Entretanto, o número de transplantes ainda é insuficiente para atender a demanda crescente de pacientes que aguardam na lista de espera (SANTOS; MASSAROLLO, 2005). Além disso, há subnotificação da morte encefálica às Centrais de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos, falta de política de educação continuada aos profissionais de saúde sobre o processo de doação-transplante e recusa familiar em relação à doação de órgãos e tecidos (SILVEIRA, 2009; ABTO, 2009).

Diante disso, o Ministério da Saúde tem aplicado diversas estratégias para o aumento das doações de órgãos e tecidos, dentre elas, destacam-se a melhoria da infraestrutura, principalmente, na capacitação de equipes para realização de contato com os familiares dos possíveis doadores; incentivo financeiro aos hospitais e sensibilização da sociedade, por meio de campanhas anuais de incentivo à doação de órgãos e tecidos (BRASIL, 2012).
Em 2012, as ações do Ministério da Saúde (MS) foram relacionadas ao aumento de repasse de recursos para a ampliação do número de transplantes no Sistema Único de Saúde, estímulo para alguns hospitais que realizam transplante de rim e aumento de custeio financeiro para aquisição de medicamentos para pacientes que realizam transplantes e que apresentam rejeição aguda (BRASIL, 2012).
Figura 1 – Divulgação do MS para incentivo a doação de
órgãos na rede social Facebook.


Fonte: BRASIL (2012).
As ações do Ministério da Saúde têm demonstrado efetividade, isso é visto pelos dados registrados, em 2012, que apontaram que o Brasil bateu o recorde de 13,6 doadores por milhão de população (PMP), já no primeiro quadrimestre deste ano, meta prevista para 2013. No primeiro quadrimestre de 2012, o Brasil registrou o aumento de 29% no número de doadores (726 doadores), sendo que no mesmo período de 2011 foram registrados 564 doadores. 
Interessante esses avanços, não é mesmo?! Mas, caro colega para a garantia do sucesso da doação de órgãos e tecidos, é essencial o estabelecimento alguns quesitos importantes, principalmente na determinação do potencial doador. Você sabe como isso é realizado? Vamos ver como é feito?
Para Santos e Massarollo (2005), o processo de doação de órgãos e tecidos é um conjunto de ações e procedimentos que transformam um potencial doador em um doador efetivo. Mas, o que torna alguém um potencial doador?
Nos casos de doadores vivos, considera-se como potencial doador todo cidadão juridicamente capaz, que, nos termos da lei, possa doar órgão ou tecido sem comprometimento de sua saúde e aptidões vitais, durante ou após a doação. Pela lei, os parentes até quarto grau e cônjuges podem ser doadores; os não parentes, somente com autorização judicial (ABTO, 2002).
 Já nos casos de doação de órgãos de pacientes em óbito, é considerado como potencial doador, todo aquele que tenha diagnóstico de morte encefálica, no qual não se tenha contraindicações clínicas que manifestem riscos aos receptores dos órgãos. Esse processo pode demorar horas ou dias, o que pode causar estresse e trauma à família, comprometendo assim o número de doações (SANTOS; MASSAROLLO, 2005).
A definição de morte encefálica (ME) pode variar de acordo com a legislação de cada país. No Brasil, a Lei dos Transplantes (Lei 9.434/97) que normatiza a obtenção de órgãos para transplante, em seu Capítulo II, Artigo 3°, transfere para o Conselho Federal de Medicina (CFM) a responsabilidade de definir os critérios clínicos para o diagnóstico de morte encefálica.
A Resolução nº 1.480/97 do CFM define a morte encefálica como a parada total e irreversível do tronco e hemisférios cerebrais. Nessa situação, a função cardiorrespiratória é mantida através de aparelhos e medicações (ABTO, 2009).
 Antigamente a definição de morte era conceituada pela parada cardiorrespiratória, mas, diante dos avanços da fisiologia, a ME veio substituir essa definição, uma vez que se observou que o que nos mantêm vivos é o funcionamento do encéfalo, que comanda todo o nosso corpo (SILVA, 2009).
Vargas e Ramos (2006) citam que a definição de morte encefálica surgiu também para otimizar a captação de doação de órgãos. 
Diante das mudanças do significado de morte e dos avanços no processo de doação e transplante de órgãos, como a sociedade e a família lidam com a morte encefálica?
A morte encefálica, ainda é pouco compreendida pela população, principalmente, os familiares que tem dificuldade em reconhecer que seu ente querido, que se encontra aparentemente vivo por apresentar batimentos cardíacos e temperatura corporal normal, esteja em óbito. O desconhecimento e/ou não aceitação de morte encefálica é compreensível, pois a maioria das pessoas entende que a morte é a ausência das funções respiratória e cardíaca (SILVA, 2009).
Assim, percebemos o dilema no enfrentamento da morte encefálica pelos familiares, o que interfere desfavoravelmente no processo de doação de órgãos e tecidos, pois de acordo com a Lei 10.211/2001 a autorização da retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas, para transplante, só poderá ser realizada mediante autorização de seus parentes ou cônjuge, firmada em documento subscrito (SILVA 2009; BRASIL, 2001). 
Cabe a equipe de saúde orientar e informar adequadamente os familiares sobre os conceitos da morte encefálica e os benefícios da realização da doação dos órgãos e tecidos. 
Caro leitor, você percebe a complexidade da situação? Nessas situações o profissional deve cuidar tanto da família que perdeu um ente querido, como atuar em prol de possíveis receptores dos órgãos doados. Percebe o dilema ético encontrado nessa situação?
 Saber lidar com a morte, com o luto da família, e tomar decisões e agir correta e eticamente geram dilemas na atuação profissional.
Os dilemas éticos estão presentes nas situações de tomada de decisão ou realização de uma determinada ação. Não podemos deixar de pensar que as pessoas possuem valores morais, culturais e, assim não poderiam se separar deles no exercício de sua profissão.
Neste contexto, a enfermagem juntamente com a equipe multiprofissional, desempenha um papel muito importante, na captação de órgãos, atuando, principalmente, na identificação de doadores, manutenção hemodinâmica e na comunicação com os familiares do doador, sendo esta a mais importante de todos os seus atributos. De acordo com o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem, Art. 19 é dever desses profissionais respeitar o pudor, a privacidade e a intimidade do ser humano, em todo seu ciclo vital, inclusive nas situações de morte e pós-morte (SILVA e SILVA, 2009).
A partir da abordagem adequada e dialógico franco e direto, é que se consegue explicar todos os trâmites da doação e transplante de órgãos e tecidos aos familiares, bem como ressaltar a necessidade de prudência na tomada de decisão, a fim de que sejam respeitadas as vontades do parente que faleceu.
Mediante os avanços e mudanças no âmbito da doação e transplante de órgãos, os dilemas envolvidos e a legislação de enfermagem acerca desse tema, é imprescindível que nós profissionais estejamos atualizados para atuar com respeito, competência e ética, possibilitando assim o aumento de doações de órgãos e tecidos.
Fonte:http://www.jornadaead.com.br/cofen/atualizacoes/Atualizacao_Doacao_de_orgaos_e_tecidos_e_os_dilemas_eticos_envolvidos.html

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